Confronto de Idéais – Jornal O Povo 26/08/2016

O presidente em exercício Michel Temer (PMDB) decidiu transferir ao Departamento Nacional de Obras contra a Seca (Dnocs) as verbas destinadas ao combate à seca no Nordeste. A iniciativa reverte o acordo feito pela presidente afastada Dilma Rousseff (PT), de que caberia aos governadores a gestão dos recursos. A decisão vai agilizar as obras de combate à estiagem?

 Sim

Nas últimas semanas o Dnocs, autarquia federal que há mais de um século une a produção de conhecimento científico à efetiva intervenção hídrica no Semiárido Nordestino, voltou às páginas da imprensa, a nível nacional e, especialmente, local. O momento é oportuno para resgatar a função precípua desta importante instituição com atuação na gestão hídrica e no desenvolvimento regional sustentável. 

Entretanto, o debate gira em torno de questões políticas, quando deveria ser de apoio dos diversos poderes, inclusive a imprensa, ao Dnocs – especialmente referente ao hoje reduzido, mas competente e empenhado, quadro de servidores. Tal fato deve-se à destacada dúvida sobre a falta de capacidade atual do órgão em assumir seu objetivo principal, que foi a construção de toda uma rede de infraestrutura hídrica (maior construtor, em número, de barragens no Brasil), erguendo estratégicos monumentos da engenharia nacional, como as barragens de Orós e Castanhão (CE), Coremas-Mãe D’Água (PB) e Açu (RN), ao lado do desenvolvimento de métodos científicos de irrigação e reprodução de peixes na região semiárida.

Nessa conjuntura de ataque ao serviço público, precisamos acreditar mais naqueles que servem ao povo, exemplo do Dnocs, que sempre cumpriu sua missão, especialmente nos anos de sucessivas e cíclicas estiagens, como esta de cinco anos de seca, caindo no descrédito por falta de recursos financeiros e de uma tão sonhada reestruturação, adaptando-o às atuais condições ambientais.

O Dnocs, com seu dedicado corpo de servidores, tem expertise para cuidar de sua infraestrutura hídrica, garantindo a segurança e a manutenção das mais de 320 barragens construídas, que hoje abastecem as grandes, médias e pequenas cidades dos nove estados onde atua, apesar de determinadas manobras de apropriação de suas águas – sob uma ótica de “gestão compartilhada” – sem o mínimo retorno para a conservação de seu patrimônio.

Enfim, com recursos garantidos, reestruturação e concurso público, este pode ser o início de uma “nova era” para o Dnocs, com uma “luz no fim do túnel” na valorização desta instituição, que pertence a todos os nordestinos, que são brasileiros!

“O Dnocs tem expertise para cuidar de sua infraestrutura hídrica, garantindo a manutenção das mais de 320 barragens construídas”

[icon name=”chevron-right” class=”” unprefixed_class=””] Zita Timbó
zitaraujo@gmail.com
Engenheira do Dnocs e mestre em Gestão Hídrica

Não

A Secretaria de Recursos Hídricos do Ceará vem desenvolvendo exitoso programa de implantação de adutoras de montagem rápida e abastecimento de água por meio de carros-pipa, pensado e amadurecido no âmbito de um Grupo de Contingência, de elevado nível, composto por técnicos da Secretaria dos Recursos Hídricos, Cogerh, Sohidra, Funceme, Cagece, Defesa Civil e Gabinete do Governador, e Comitê das Secas, que buscam soluções para o abastecimento de sedes municipais, grandes distritos e áreas rurais difusas. São medidas de cunho técnico que visam ao socorro imediato de populações cujos sistemas convencionais de abastecimento estão em colapso. Vale lembrar a expertise adquirida pelo Estado neste tipo de programa – desde sua concepção até a execução. São cerca de 800 km de adutoras e centenas de carros-pipa distribuídos pelos sertões cearenses.

Os recursos financeiros para a cobertura deste programa são originários do Governo Federal, sob a rubrica “Dinheiro de Resposta à Emergência”. Noticia a imprensa que doravante o destino destes recursos será o Dnocs, o qual terá, caso se consolide a nota, a missão de alocá-lo no mesmo fim.

Ressalte-se que este órgão de secular experiência, criador e implementador de pequenas, médias e grandes barragens em todo o Nordeste, foi gestado por homens de visões como José Cândido de Paula Pessoa, Guimarães Duque, Rui Simões de Menezes, Genésio Martins de Araujo, Ademar Braga, Jarbas Studart Gurgel e José Lins Albuquerque, para homenagear somente alguns já falecidos, e tantos servidores e engenheiros agrônomos e civis vocacionados em defesa deste valoroso organismo regional.

Mesmo reconhecendo a premência do revigoramento do Dnocs, este órgão não tem recebido nas últimas décadas o aporte financeiro à sua nobre missão. Por sua vez, ponderando a estrutura montada pelo Estado, e em plena atividade, aliada ao colapso hídrico e ao escopo das obras emergenciais, mudar a gestão deste programa neste momento é temerário dada a irremediável urgência de sua execução.

Enquanto isso, lá no sertão, a população campesina clama por adutoras, poços e pipas.

“Mudar a gestão deste programa neste momento é temerário dada a irremediável urgência de sua execução”

[icon name=”chevron-right” class=”” unprefixed_class=””]  José Flávio Barreto de Melo
flaviobarreto.barreto@gmail.com

Presidente da Associação de Engenheiros Agrônomos do Ceará; Membro da Academia Cearense de Engenharia

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